Advogado, bacharel em Direito pela UERJ, jornalista formado na UFRJ e mestre em Direito pela UFJF, com pós-graduação em Direito Social e Direito Bancário.
Em tempos de grave crise sanitária decorrente da chegada do Covid-19 (novo coronavírus) ao Brasil, muitos pequenos e médios empresários perguntam-se o que fazer face à quase certa queda nas cadeias de demanda e de oferta. De fato, por um lado prevê-se o achatamento da procura por bens e serviços; por outro, estima-se que o próprio fornecimento de materiais, equipamentos e matéria-prima poderá sofrer interrupções. Some-se a isso o fato de que o pequeno e médio empresário em regra já enfrenta situações de instabilidade econômico-financeira, com constantes flutuações em seu fluxo de caixa, falta de crédito facilitado, incertezas tributárias etc. e tem-se um cenário não muito positivo. Nesse caso, o que pode ser feito, do ponto de vista jurídico, sem maiores riscos? Em termos gerais, pode se dizer que, nesse primeiro momento, o empresário deve atentar para duas áreas em especial: obrigações trabalhistas e contratuais em geral. A seguir, vai um breve panorama das medidas que, em tese, o empresário poderá adotar, obviamente consideradas as peculiaridades de seu ramo de negócio.
Obrigações trabalhistas
A Medida Provisória nº 927, de 22 de março de 2020, introduziu uma série de novidades na legislação trabalhista. Como essa medida provisória tem por objeto reger atos e fatos jurídicos trabalhistas exclusivamente no período do estado de calamidade pública decretado pelo Legislativo, trata-se de norma temporária, de caráter excepcional, destinada à preservação do emprego e da renda. Dentre as providências ali previstas destacam-se:
Todas as providências mencionadas podem ser adotadas de imediato, preferencialmente sob a orientação especializada de um advogado. Já outras providências previstas na MP 927/2020, como a preponderância do acordo individual escrito sobre as normas legais, convenções e acordos coletivos (prevista no art. 2º) e a suspensão dos contratos de trabalho para qualificação do trabalhador (art. 18), apresentam aspectos legais controversos e, portanto, ensejam risco jurídico acentuado neste momento. Fala-se até que a suspensão contratual seria revogada. Recomenda-se cautela. O mesmo pode ser dito em relação à redução de salários e jornada sem anuência do sindicato profissional da categoria.
Obrigações contratuais em geral
Regra geral, as obrigações contratuais são feitas para serem cumpridas, isto é, uma vez pactuadas, as cláusulas do contrato viram “lei” entre as partes. Isto é válido para os contratos empresariais (por exemplo, entre fornecedores), civis (locação do imóvel) e de consumo (com os clientes). Claro que há exceções. Por exemplo, as cláusulas que violem disposições de ordem pública, ou que coloquem o consumidor em desvantagem. Mas são exceções que não contrariam a regra geral. Todavia, como ficam os contratos empresariais, civis e de consumo em situações emergenciais, como a que atualmente vivemos?
Há cem anos o mundo viveu situação parecida (embora muito mais grave). A Primeira Guerra Mundial e a Gripe Espanhola deixaram um saldo de milhões de mortes e de desestruturação produtiva. Simplesmente, não havia como cumprir os contratos. Tornou-se corrente naquela época a chamada “teoria da imprevisão”, a qual, em termos gerais, significava mais ou menos o seguinte: os contratos devem ser cumpridos tal qual foram pactuados, mantidas as circunstâncias fáticas na qual surgiram. Se as circunstâncias mudam drasticamente, sem culpa de qualquer das partes e sem que fossem previsíveis as mudanças, a parte prejudicada pode pedir revisão dos contratos.
O Código Civil brasileiro apresenta quatro artigos inspirados pela teoria da imprevisão – 317 e 478 a 480. Assim, a depender das circunstâncias do caso concreto, o contratante prejudicado pelo fato extraordinário e imprevisível pode pedir a resolução (extinção) do contrato ou a sua revisão. Sem prejuízo dessas normas, e especificamente em relação às locações (residenciais ou comerciais), há a possibilidade de revisão do valor do aluguel, após três anos de vigência do contrato, de modo a ajustá-lo ao preço de mercado.
No tocante aos contratos bancários (capital de giro, investimento), o Conselho Monetário Nacional autorizou as instituições financeiras, através da Resolução nº 4.782, a fazer a renegociação em condições facilitadas, até 30 de setembro de 2020, das dívidas mantidas por famílias e empresas que tenham um histórico de adimplência. Isto vale apenas para as dívidas que estejam em situação regular. Na renegociação, o empresário deve prestar especial atenção aos seguintes pontos: se os juros continuam a fluir na vigência da suspensão; se haverá cumulação das prestações vencidas com as vincendas; e se haverá alteração no status cadastral do cliente e na sua pontuação de crédito.
Obviamente, o ideal é que o empresário busque, em primeiro lugar, renegociar os seus contratos, sempre com a assistência jurídica especializada, pois a grave situação criada pelo coronavírus a todos atinge. Todavia, é bom saber que existem alguns remédios jurídicos para a hipótese de se não obter um acordo satisfatório. Pode ser que não sejam suficientes, mas a tendência é que, no curto prazo, novas medidas sejam tomadas para impedir a total paralisação da economia. Aguardemos.
Em breve, voltaremos ao tema detalhando cada um dos assuntos aqui mencionados.
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