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Escrito por: Renato Rodrigues

Advogado, bacharel em Direito pela UERJ, jornalista formado na UFRJ e mestre em Direito pela UFJF, com pós-graduação em Direito Social e Direito Bancário.

24 de novembro de 2020 | 15H32

PAGAMENTO DE DÉCIMO TERCEIRO SALÁRIO E FÉRIAS: COMO FICA EM RELAÇÃO AOS CONTRATOS SUSPENSOS E COM JORNADA REDUZIDA?

Recentemente, o Ministério da Economia e o Ministério Público do Trabalho (MPT) emitiram posicionamentos divergentes em relação ao pagamento de décimo terceiro e aquisição de férias nos contratos de trabalho suspensos, em função das medidas excepcionais tomadas por força dos efeitos econômicos causados pelo advento da epidemia do Covid-19 (novo coronavírus) – MP 936 e Lei nº 14.020/2020.

Para o MPT, por exemplo, a suspensão dos contratos de trabalho e a redução de jornada em nada afetaram os direitos dos trabalhadores, no tocante ao décimo terceiro e às férias individuais. Já para o Ministério da Economia, nos contratos suspensos, haveria que observar a proporcionalidade de meses trabalhados, sendo certo que os meses com  prestação de serviço inferior a 15 dias não seriam computados para efeito de apuração do décimo terceiro salário.

No tocante à redução de jornada, todavia, não houve divergência entre os dois órgãos federais: tanto o pagamento do décimo terceiro quanto a aquisição de férias não seriam influenciados, devendo serem pagos normalmente ao trabalhador.

De todo modo, há divergência na interpretação em relação aos contratos suspensos. De imediato, surgem duas perguntas: o entendimento do MPT e do Ministério da Economia são vinculativos, isto é, criam obrigações para os empregadores? Qual o melhor posicionamento – o do MPT ou do Ministério da Economia?

As dúvidas são relevantes. A depender das respostas, efeitos financeiros importantes surgirão para as empresas e empregadores (enfim, pagar o 13º salário de forma “cheia”, ou não?), sem falar no potencial risco de ajuizamento de futuras reclamatórias trabalhistas tendo por objeto os direitos em questão. 

Assim, opina-se desde logo que nenhuma das orientações – do MPT e do Ministério da Economia – tem efeito vinculativo, pois somente a lei pode criar obrigações. Não obstante, tais orientações podem ter um efeito interpretativo, influenciando no comportamento dos agentes envolvidos.

Obviamente, a principal questão é como o Poder Judiciário apreciará eventuais demandas que ali cheguem tendo por objeto o pagamento do décimo terceiro salário. Trata-se, portanto, de verificar as razões que mais poderiam sensibilizar os juízes nessa questão.

De nossa parte, partimos de três premissas básicas. Primeiro, o décimo terceiro salário e as férias são direitos assegurados na Constituição e têm a natureza de direitos fundamentais sociais. Segundo, nem a MP 936 nem a Lei 14.020 fixaram regras jurídicas específicas em relação aos mencionados direitos trabalhistas, motivo pelo qual devem ser aplicadas as regras gerais. Terceiro, trata-se a nosso ver de adotar a estratégia que ofereça menor risco jurídico para os empregadores. 

Com efeito, o artigo 7º da Constituição Federal dispõe que “são direitos dos trabalhadores urbanos e rurais… VIII – décimo terceiro salário com base na remuneração integral … XVII – gozo de férias anuais…” Mais relevante ainda: o artigo 7º está encartado no Título II da Constituição, que trata dos direitos e garantias fundamentais, ou seja, os direitos e garantias que gozam de uma proteção especial por parte do Estado de Direito e cuja eficácia é oponível não apenas ao Estado-Juiz, mas também nas relações privadas (efeito horizontal). Com um status jurídico assim privilegiado, é de se esperar que os direitos sociais mereçam uma interpretação que fortaleça a sua eficácia.

Por outro lado, as medidas adotadas na MP 936 e na Lei 14.020 têm caráter excepcional e, como tal, devem ser interpretadas estritamente, aplicando-se as regras gerais em eventuais omissões legislativas. Nessa linha, importante considerar que, conforme o artigo 2º da Lei 4.090 (que trata da gratificação natalina), somente serão deduzidas as faltas legais e justificadas na apuração do tempo de serviço. No mesmo sentido, aliás, os artigos 130 e 131 da CLT, no que diz respeito às férias. A contrario sensu, outras hipóteses não seriam passíveis de dedução.

Acresce que, na forma do art.611-B da CLT (introduzido pela Reforma Trabalhista), não poderão ser objeto de convenção ou acordo coletivo a supressão ou a redução dos direitos ali elencados, dentre os quais figuram o valor nominal do décimo terceiro salário e a aquisição de férias. Se não podem ser objeto de normas coletivas, muito menos o serão por força de acordos individuais, como aconteceu em relação aos acordos de suspensão dos contratos de trabalho.

Por fim, há de se considerar a possibilidade, nada remota, caso observada a orientação do Ministério da Economia, de uma enxurrada de reclamatórias trabalhistas após o encerramento das medidas adotadas em função do coronavírus, tendo por objeto o pagamento integral das férias e do décimo terceiro. Isto sem falar no risco de autuações pelos auditores do trabalho, com base na orientação expedida pelo MPT…

CONCLUSÃO: entende-se que tanto o décimo terceiro salário quanto a aquisição de férias não devem levar em consideração os períodos de suspensão dos contratos de trabalho, ou de redução de jornada, eventualmente adotados por força de acordos individuais celebrados sob os auspícios da MP 936 e da Lei 14.020. Vale dizer, o pagamento integral de tais direitos afasta o risco jurídico de futuras reclamatórias trabalhistas, bem como de autuações administrativas.

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