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Escrito por: Renato Rodrigues

Advogado, bacharel em Direito pela UERJ, jornalista formado na UFRJ e mestre em Direito pela UFJF, com pós-graduação em Direito Social e Direito Bancário.

17 de maio de 2021 | 15H22

CORREÇÃO MONETÁRIA DO FGTS: MOTIVOS PARA CRER QUE O STF PODE ALTERÁ-LA E O QUE SIGNIFICA A MODULAÇÃO DOS EFEITOS DA DECISÃO

O Supremo Tribunal Federal (STF) retirou de pauta a ADI 5090 e adiou sine die um dos julgamentos mais esperados do ano: a forma de correção monetária dos saldos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). E não é de espantar. A se manter a linha de pensamento do Tribunal em julgados recentes, os trabalhadores têm motivos para esperar uma decisão favorável.

Mas nem sempre foi assim. O Superior Tribunal de Justiça, ao qual está afeto a unificação da jurisprudência sobre matéria infraconstitucional (leis, medidas provisórias, decretos etc), em 2018 firmou o seguinte entendimento: “A remuneração das contas vinculadas ao FGTS tem disciplina própria, ditada por lei, que estabelece a TR como forma de atualização monetária, sendo vedado, portanto, ao Poder Judiciário substituir o mencionado índice” . Tal entendimento, consagrado em sede de julgamento de recursos repetitivos (Tema 731), praticamente encerrava a discussão, pois passava a ser de obrigatória observância pelos juízes e tribunais em todo o País.

Aliás, o próprio STF, ao deixar de receber recursos fundamentados na alegada inconstitucionalidade da TR como fator de correção monetária do FGTS (Tema 787, de dezembro de 2014), sinalizou que a última palavra sobre o assunto estaria mesmo com o STJ – o qual, como vimos, acabou firmando posição pela legalidade da TR.

Estava nesse ponto o entendimento jurisprudencial quando o Min. Luís Roberto Barroso resolveu, em setembro de 2019, deferir medida cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5090, proposta por um partido político, para suspender todos os feitos que versem sobre a matéria (isto é, correção monetária do FGTS). Na ocasião, o Ministro sinalizou que “a discussão sobre a rentabilidade do FGTS ainda será apreciada pelo Supremo e, portanto, não está julgada em caráter definitivo, estando sujeita a alteração” , reconhecendo a “plausibilidade jurídica” da matéria. 

Como explicar esta aparente inflexão naquilo que vinha sendo decidido por nossas Cortes Superiores? A nosso ver, já àquela época, o STF vinha emitindo sinais de que seria possível reconhecer a inconstitucionalidade da TR em alguns casos.

O primeiro sinal veio em 2017, com o julgamento da forma de atualização monetária dos precatórios, que são documentos que consubstanciam condenações da Fazenda Pública, em seus diversos níveis – federal, estadual e municipal. No Recurso Extraordinário nº 870.947, o Tribunal afirmou que “a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança não se qualifica como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a promover os fins a que se destina”. 

O outro sinal evidente da antipatia do STF com a TR veio com o julgamento da ADC 58, em dezembro de 2020. Naquela oportunidade, o Pleno do STF deixou assentado que, não obstante a peculiaridade da correção monetária dos débitos trabalhistas, a demandar uma análise específica, “verifica-se que a TR se mostra inadequada, pelo menos no contexto da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), como índice de atualização dos débitos trabalhistas”. E mandou aplicar o IPCA na correção monetária dos débitos trabalhistas no período pré-ajuizamento e a Taxa Selic, no período posterior, como regra geral.

Por esses motivos, entende-se que os trabalhadores têm motivos reais para esperar uma decisão favorável no julgamento da ADI 5090 – muito embora se saiba que pressões políticas inevitavelmente virão. Mas aí já é algo que foge ao âmbito jurídico do presente artigo. Certo é que a Taxa Referencial (TR), tal qual existe hoje, é calculada a partir de uma série de componentes que não levam em consideração a inflação do período.

Muito bem. Se o STF declarar inconstitucional a TR para atualização monetária dos saldos do FGTS, como ficamos, então? O mais provável, nesse caso, é que o Tribunal mande aplicar o INPC ou o IPCA, índices que realmente se aproximam da aferição da perda do poder de compra. De fato, comparada a TR com o INPC ou o IPCA no período (principalmente entre 1999 e 2013), observa-se que aquela nitidamente fica em patamares bem inferiores. Não por acaso, então, os saldos do FGTS acabam “desvalorizando”, se comparados com outros ativos.

Outra pergunta frequente que vem à mente de quem se debruça sobre o assunto é a seguinte: a partir de quando e para quem valerá a decisão? Nessa linha, é importante anotar que o STF tem a faculdade de “modular” os efeitos da decisão. Isso significa que, por motivos de segurança jurídica, a decisão só passaria a valer a partir de um determinado marco temporal, à escolha do Tribunal. Há várias opções nesse sentido. Mas, em qualquer cenário, avista-se que dificilmente vai beneficiar quem não buscou a tutela do Poder Judiciário, isto é, quem não ajuizou previamente uma ação pleiteando a recomposição dos saldos do FGTS de acordo com um índice que realmente reflita a inflação do período. 

Enfim, estes são somente alguns dos aspectos jurídicos envolvidos no julgamento da ADI 5090. Há outros, que abordaremos em outra oportunidade. Por enquanto, ficam estas linhas como matéria para reflexão da providência que os interessados entendam pertinente tomar.

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